quinta-feira, 26 de maio de 2016

Confronto: Regulamento e Acto administrativo


         Frequentemente, os órgãos administrativos vêem-se confrontados com a necessidade de completar ou desenvolver os comandos genéricos contidos na lei, visando a viabilização da sua aplicação às situações concretas que ocorrem no quotidiano. Outras vezes, é o próprio legislador a pretender que sejam os órgãos competentes a disciplinar certo tipo de situações.   
         Nestes casos, a Administração edita normas jurídicas (regras de conduta gerais e abstractas) com fundamento na lei – os chamados regulamentos administrativos, cuja definição doutrinária se traduz em “normas jurídicas emanadas no exercício do poder administrativo por um órgão da Administração ou por outra entidade pública ou privada para tal habilitada por lei”.
         Porém, o exercício do poder administrativo não se esgota, como sabemos, na emanação de normas gerais e abstractas. Efectivamente, a Administração Pública é, outrossim, muito solicitada para a resolução de situações específicas, problemas individuais, casos concretos, através da tomada de decisões.
         Assim, assistimos a uma forma de actuação distinta da enunciada anteriormente, pela qual a Administração procede à aplicação da lei e dos regulamentos às situações da vida real – forma essa que consubstancia a prática de actos administrativos, os quais a doutrina define como “actos jurídicos unilaterais praticados no exercício do poder administrativo por um órgão da Administração ou por outra entidade pública ou privada para tal habilitada por lei e que traduzem a decisão de um caso considerado pela Administração, visando produzir efeitos numa situação individual e concreta”.
         Dessarte, apesar de serem ambos comandos jurídicos unilaterais emitidos por um órgão competente no exercício de um poder público de autoridade, não parece tarefa difícil estabelecer a distinção entre estas figuras:
         - O regulamento, enquanto norma jurídica que é, constitui uma regra geral – isto é, define os seus destinatários por meio de conceitos ou categorias universais, sem individualização de pessoas – e abstracta – na medida em que define as situações a que se aplica também por via de conceitos ou categorias. Sendo um comando abstracto, o regulamento não se esgota, normalmente, numa aplicação.
         - Pelo contrário, o acto administrativo é individual – ou seja, reporta-se a uma ou algumas pessoas especificamente identificadas – e concreto – pelo que visa regular uma determinada situação bem caracterizada .
         Assim, por exemplo, a Administração ao fixar as condições de concessão de bolsas aos alunos, ignora, à partida, quais serão os destinatários efectivos desse comando, que será aplicável todas as vezes que se tratar de concessão ou recusa de bolsa. Nessa medida, estamos ante um regulamento, sendo o comando de natureza geral e abstracta.
Por outro lado, quando a Administração defere ou indefere um requerimento que lhe foi dirigido por um estudante, está a decidir um caso concreto relativo a um destinatário determinado, pelo que se trata de um acto administrativo, por sua vez individual e concreto.
         Apesar da aparente facilidade, há situações em que esta diferenciação se afigura mais complicada. É o que acontece, por exemplo, no caso dos comandos relativos a um órgão singular: será norma se dispuser em função das características da categoria abstracta e não da pessoa concreta titular do cargo; ou dos comandos relativos a um grupo restrito de pessoas, todas determinadas ou determináveis: é norma desde que disponha por meio de categorias abstractas, será acto se contiver a lista nominativa dos indivíduos abrangidos, devidamente identificados.
         Ora, a distinção destes dois conceitos revela-se extremamente útil quanto a alguns aspetos, como sejam: a interpretação e integração – já que o regulamento é interpretado e as suas lacunas integradas de acordo com as regras próprias da interpretação e integração das normas jurídicas, enquanto para o acto administrativo existem outras regras específicas aplicáveis nesta matéria; os vícios e formas de invalidade – sendo que nesta matéria o paradigma aplicável ao regulamento é o das leis e o modelo seguido no acto administrativo é o do negócio jurídico; ou ainda quanto à impugnação contenciosa – na medida em que, para além de os regulamentos poderem ser considerados ilegais em quaisquer tribunais, contrariamente ao que sucede com os actos administrativos ( que só podem ser anulados nos tribunais administrativos), os termos da impugnação contenciosa de regulamentos e actos administrativos são diferentes quanto à legitimidade, aos prazos, regras processuais, entre outros.






José Gama, n.º 26660

Sem comentários:

Enviar um comentário