domingo, 24 de abril de 2016

A Discricionariedade Imprópria, Nuno Rodrigues


Para abordar o tema importa saber primeiramente o que entender por poder discricionário, este começou por ser entendido como um poder livre ou até mesmo arbitrário onde simplesmente não tinha de contrariar a lei. Hoje o poder discricionário é atribuído por lei tendo a mesma como fundamento. As razões para a existência deste poder são várias. Entre elas, permitir a melhor resolução dos casos concretos, o seu exercício aumentar a responsabilidade da administração e o facto de ser uma necessidade pois a lei não consegue controlar todos os aspectos, como por exemplo estipular “quem serão os melhores governadores civis para cada distrito”, como nos refere o professor Diogo Freitas do Amaral (isto sem prejuízo da extinção do cargo de governador civil nos tempos hodiernos).
Como foi supra mencionado, nos dias de hoje, este poder não é arbitrário tendo por isso vários limites como princípios (designadamente igualdade, proporcionalidade, imparcialidade, entre outros), as leis e até mesmo os regulamentos estando nestes últimos em causa um fenómeno de auto vinculação cuja sua violação irá originar uma ilegalidade (princípio da inderrogabilidade singular dos regulamentos). Deve contudo ser referido que em nenhum ato tudo é discricionário nem tudo é vinculado, existindo sempre um misto dos dois, sendo conveniente falarmos em atos predominantemente vinculados e atos predominantemente discricionários pois num ato a competência e o fim são sempre vinculados mas o momento, a fundamentação, a forma e ate mesmo o conteúdo podem ser discricionários, daí, com mais discricionariedade ou mais vinculação o ato acaba por conter sempre algo das duas figuras não sendo totalmente abrangido por nenhuma.
Com isto aparece a discricionariedade imprópria, algo que alguma doutrina considera como uma “falsa” discricionariedade. Dentro desta categoria estão incluídas a liberdade probatória, a discricionariedade técnica e a justiça burocrática. A liberdade probatória é quando a administração tem a liberdade de, em relação aos factos que servirão de meio de prova, analisar e interpretar os mesmos. A discricionariedade técnica é quando a administração precisa de estudos de natureza técnica para chegar à solução (exemplo: local para a construção de uma barragem). Por último, a justiça burocrática ou administrativa, onde a administração tem de avaliar pessoas ou comportamentos (exemplo: avaliar alunos). Nestes três casos alguns autores, nomeadamente o professor Freitas do Amaral, o professor Jorge Rodrigues Simão, entre outros defendem que não existe uma verdadeira discricionariedade uma vez que não existe um poder de escolha mas sim a “obrigação de escolher a solução mais acertada”. Assim sendo na justiça burocrática, por exemplo, o professor não tem um poder discricionário ao dar a nota mas sim a obrigação de apurar a única solução correta.
Não parece, contudo, a solução mais adequada pois nas três situações acima referidas de discricionariedade imprópria não parece existir apenas uma solução

acertada mas várias dentro de um certo parâmetro. Assim sendo, na discricionariedade técnica, em muitos casos, colocar uma barragem ou uma ponte num local ou alguns metros mais ao lado vai ser exactamente igual e as duas soluções vão estar adequadas ao pretendido ou então na justiça burocrática, um aluno ser avaliado em 12.1 por um professor e outro professor avaliar o mesmo aluno em 12.3, as duas notas vão estar certas provando novamente que não existe apenas uma única solução possível. Por último, na liberdade probatória, numa “avaliação de um imóvel para efeitos de liquidação de um imposto sobre o património”, será que o mesmo imóvel avaliado por dois profissionais distintos não poderá ter valores diferentes mas ambos adequados?

Concluindo, parece que em nenhum dos três casos de discricionariedade imprópria existe uma só solução acertada o que leva a crer que tanto a liberdade probatória, a justiça burocrática e a discricionariedade técnica são exemplos típicos de discricionariedade. Esta como um espaço de liberdade da “administração para determinar ela própria as escolhas a fazer” não fazendo sentido a qualificação de “impropria”.
Nuno Rodrigues, nº 25774

sexta-feira, 22 de abril de 2016

Lara Afonso 25790 post1

Comentário à seguinte frase:

“Desde  que  a  lei  processual  administrativa  passou  a consagrar  acções  de
condenação à prática de acto devido, o mecanismo do indeferimento tácito deixou de ter qualquer utilidade prática” Exame de 20/6/2009, Paulo Otero

Os actos tácitos podem ser um indeferimento tácito, que permite a um particular dirigir-se a um Tribunal ou um deferimento tácito, que aprova a pratica de um determinado exercício perante o silencio da Administração Pública.

Perante um requerimento de um particular, dirigido a um órgão da Administração, esta tem o dever legal de decidir dentro de 90 dias.

Á luz do CPA de 1991 e antes da entrada em vigor do CPTA, (entre 1991 e 2004) a regra geral prevista no artigo 109ºCPA era que decorrido o prazo geral para responder, associava-se á omissão como regra geral o indeferimento tácito. Se Administração não se pronuncia-se perante decreto apresentado não se presumia o deferimento por razões de segurança jurídica, presumia-se sim deste modo o indeferimento tácito.
Mas por regra geral o indeferimento tácito também protegia os particulares. Entre 1991 e 2004 ainda não estava na disponibilidade dos particulares de recorrerem nos Tribunais Administrativos à acção de condenação á pratica do acto administrativo devido. Um particular não podia exigir uma decisão por parte dos tribunais até á data de 2004.
O facto do legislador estabelecer como regra geral o indeferimento tácito a ser impugnado aos tribunais administrativos desprotege o particular na medida  de que se a lei não estabelece-se indeferimento tácito e como o contencioso administrativo não detinha ainda a acção de condenação á pratica do acto administrativo devido, o particular não poderia mais nada fazer, ficava desprotegido. O artº 129º surge para que o particular tenha um acto para impugnar aos Tribunais Administrativos.

A acção de derrogação passou a existir apenas em 2004, A partir de 2004 o artº 109º CPA considerou-se que deixou de ter a sua rácio legis, ou seja derrogado pelo CPTA.
A sua função era permitir que o particular pudesse impugnar no tribunal, perante uma omissão a actuação.

O Artº 129º CPA diz-nos que numa situação de omissão o particular tanto pode dirigir-se ao Tribunal Administrativo fazendo uso dos meios jurisdicionais ou também pode apresentar reclamação ao recurso hierárquico que garante uma pratica ao acto administrativo omisso. Perante uma omissão pode o particular praticar o acto que a Administração omitiu.

No anterior CPA nada se dizia sobre um particular perante uma omissão poder reclamar ou recorrer hierarquicamente pedindo um acto omisso.

Deixa de haver indeferimento tácito, o que há é a possibilidade de um particular se dirigir à administração pedindo a pratica do acto ou dirigir-se à administração pedindo a condenação do acto.

Só há deferimento tácito nos casos expressamente previstos na lei, o Legislador optou por dar maior liberdade no exercício da actividade. Diminui requisitos e agrava regime sancionatório.



Lara Afonso 25790 

sábado, 16 de abril de 2016

O Poder Discricionário na Nomeação do Chefe de Estado-Maior do Exército

(na sequência do artigo do Diário de Notícias: http://www.dn.pt/portugal/interior/ministro-recebe-os-quatro-candidatos-a-chefe-do-exercito-5119900.html)


Tendo em conta o pedido de demissão apresentado pelo Comandante do Exército, o General Carlos Jerónimo, e a sua consequente exoneração pelo Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa, abriu-se um novo processo de nomeação para o cargo de Chefe de Estado-Maior do Exército.
Assim, consultamos a Lei de Bases das Forças Armadas (LBFA) – Lei Orgânica nº1-A/2009, alterada pela lei 6/2014 – e recorremos a conceitos do direito administrativo para melhor entender este processo, nomeadamente em relação aos poderes de vinculação e discricionariedade do acto administrativo que se avizinha.

Encontramos o poder vinculado deste acto administrativo nas competências – a precedência de lei. Na mencionada lei, prevê o artigo 18º/1 (em anexo) a competência de nomeação e exoneração atribuída ao Presidente da República, cabendo ao Ministro da Defesa Nacional a iniciativa de apresentar uma proposta, uma vez ouvido o Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas que por sua vez deve escutar o Conselho Superior do Exército (art. 18º/2).
Olhando agora a discricionariedade, começamos por notar que esta não existe em termos estruturais da norma, uma vez que o operador deôntico nos diz que o órgão competente “deve” nomear o titular do cargo aqui em análise.

Uma vez que a lei não específica quem pode ou não ser nomeado para o cargo aqui discutido, o poder discricionário deste acto administrativo é amplo, sendo limitado apenas pelos princípios jurídico-administrativos (neste caso com especial incidência nos da boa administração e da imparcialidade) e por concepções político-militares que o Ministro da Defesa e o Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas tenham.

Finalmente,  encontramos no art. 18º/4 uma última consagração do poder discricionário, cabendo ao Presidente da República a liberdade de aceitar ou recusar o nome sugerido, dentro da justiça administrativa e burocrática (para alguma doutrina um tipo de discricionariedade imprópria, assunto que discutiremos noutro post).

Não parece haver neste preceito legal espaço à discricionariedade conceptual, aos conceitos indeterminados (outro tema a ser futuramente discutido aqui).


Anexo:

 Artigo 18.º
Nomeação dos Chefes de Estado -Maior dos ramos
1 — Os Chefes de Estado -Maior dos ramos são nomeados
e exonerados pelo Presidente da República, sob
proposta do Governo, a qual deve ser precedida da audição,
através do Ministro da Defesa Nacional, do Chefe do
Estado -Maior -General das Forças Armadas.
2 — O Chefe do Estado -Maior -General das Forças Armadas
pronuncia -se, nos termos do número anterior, após
audição do Conselho Superior do respetivo ramo.
3 — Sempre que possível, deve o Governo iniciar o
processo de nomeação dos Chefes de Estado -Maior dos
ramos pelo menos um mês antes da vacatura do cargo, por
forma a permitir neste momento a substituição imediata
do respetivo titular.
4 — Se o Presidente da República discordar do nome
proposto, o Governo apresentar -lhe -á nova proposta.


Francisco Vasconcelos (26558)